Quarta-feira, 01.10.14

A Europa que os alemães querem só dá recessão

A Alemanha continua a desejar mais austeridade para a Europa, mesmo com a crise a bater-lhe à porta.

As principais economias do euro - Alemanha, França e Itália - estão ou em recessão, ou em anemia.

O Sul da Europa continua a patinar, com muito desemprego e muita dívida em Portugal, Espanha e Grécia.

A Irlanda melhorou apenas ligeiramente, e as coisas também não vão especialmente bem na Polónia ou na Holanda.

 

Quatro anos de intensa austeridade, imposta pela Alemanha da Sra Merkel, deram nisto: uma Europa em profunda crise.

As tensões políticas, como seria de esperar, multiplicam-se.

Os extremismos crescem em França, em Itália, na Grécia, e na própria Alemanha começam também a nascer.

Porém, os alemães não aprendem, nem querem abandonar a sua postura dura e teimosa.

 

Mesmo quando Draghi defende uma expansão da procura, com baixas de impostos e investimentos públicos, a Alemanha diz não.

Não quer nada, e ataca as intenções de Draghi de expandir a oferta monetária, baixando os juros e injectando dinheiro na economia.

Mesmo com a Europa atacada pelo desemprego, pela recessão, pela deflação e pela dívida, a Alemanha tudo rejeita e tudo sabota.

Até quando continuará esta cegueira?

 

 

publicado por Domingos Amaral às 10:39 | link do post | comentar | ver comentários (1)
Segunda-feira, 29.09.14

Costa pode ser o Obama lusitano

Como eu já esperava, António Costa venceu folgadamente contra António José Seguro.

Por mais que o outro o atacasse, poucas dúvidas havia que entre os dois, ele era o melhor.

E agora, com o PS a seus pés, Costa tem de pensar em como ganhar o resto do país.

A sua personalidade tem várias vantagens, a principais das quais é que ele alegra a esquerda sem assustar a direita.

 

Conheço muita gente de direita que tem simpatia, admiração e respeito por António Costa, e que admite mesmo votar nele.

A direita desiludida com Passos e Portas poderá, talvez pela primeira vez, votar no PS, pois a fúria contra o Governo é imensa.

À esquerda, embora o PCP tenha vindo a crescer, o desmembramento do Bloco poderá ser também um aliado de Costa.

Louçã ainda empolgava muitos, mas isso não se passa com a actual liderança bicéfala, de Semedo e Martins.

 

Portanto, Costa pode entusiasmar os que sempre votaram PS, mais aqueles que votaram no Bloco ou noutros fenómenos de esquerda, como Marinho e Pinto e o Livre, e ainda pode ganhar votos ao centro e mesmo à direita.

Como é que isso se consegue?

Enganam-se os que pensam que é preciso ter muitas ideias e fazer muitas promessas.

 

Obama provou que mais importante que políticas concretas é mudar o estado de espírito das pessoas.

Contra a austeridade brutal, a esperança.

Contra a recessão geral, a crença que há um futuro melhor para os portugueses

O "yes, we can" de Obama pode ser adaptado para Portugal.

 

Basta querer, basta falar diferente, basta acreditar.

Tal como George W. Bush na América, Passos e Portas cometeram tantos erros e estragaram tanto o país que a mudança é muito desejada pela grande maioria dos portugueses.

Daqui até às eleições, a única dúvida é saber quantos serão. 

publicado por Domingos Amaral às 09:57 | link do post | comentar | ver comentários (1)
Quinta-feira, 18.09.14

A Escócia já chegou à Madeira?

Um dos danos colaterais do referendo na Escócia é a animação que para aí vai nos locais que também desejam independência.

Na Catalunha, no País Basco, em certas regiões da Bélgica, já todos andam animados com a possibilidade de seguirem a Escócia.

E, como não podia deixar de ser, o mesmo se passa na Madeira.

 

Sim, é verdade, a Escócia já chegou à Madeira!

Na cara de Alberto João Jardim há já um sorrisinho tipo "eu não vos dizia que isto um dia mudava?" 

Ainda por cima, se a Escócia tem whisky, a Madeira tem o seu vinho!

Não tem petróleo, nem tantos milhões de pessoas, mas tem o Cristiano Ronaldo, que dá para uma bela campanha de marketing!

 

Se no referendo escocês vencer o Sim, preparem-se pois para uma sessão de fogos de artifício no Funchal.

Será, aposto, quase tão forte como as das Passagens do Ano!

Jardim sairá à rua, em pelota se for preciso, para festejar a grande possibilidade de, finalmente, a Madeira ser independente!

 

O pior é se isto pega.

E porque não a Galiza, o Alentejo, o Algarve, a Andaluzia, o Languedoc, a Bretanha, a Baviera?

Sim, porque não fragmentar todas as nações, uma a uma, em pequenas cidades estados?

Porque não um feudalismo digital com páginas no Facebook e conta no Twitter?

Como dizia Karl Popper há muitos anos, o único grave problema do princípio da autodeterminação é que é autoagravante, nunca mais se pára.

Se virmos bem, há razões para tudo, até para Algés se separar definitivamente de Miraflores... 

publicado por Domingos Amaral às 12:34 | link do post | comentar | ver comentários (1)
Quarta-feira, 17.09.14

A Escócia quer ser igual a Portugal?

Nunca fui à Escócia mas tenho pena.

Pelas imagens que tenho visto ao longo da vida, deve ser bem bonita.

E tens bons líquidos, como o petróleo e o whisky, que já não está na moda, como o gin, mas continua a vender muito por esse mundo fora.

Contudo, já estou um bocado farto de ouvir falar no referendo na Escócia.

 

Confesso que não consigo perceber o desejo dos escoceses.

A primeira razão é que eu pensava que a Escócia já era independente, não precisando de o voltar a ser.

Na Escócia há parlamento, governo, campeonato de futebol, seleção nacional, e muitas outras coisas.

É essa a maravilha, e a beleza do Reino Unido.

Por vezes, andam todos juntos, como nos Jogos Olímpicos, mas muitas vezes vão separados, como no futebol.

Galeses, Irlandeses do Norte, Escoceses, Ingleses, são todos diferentes, cada um com a sua capital e as suas manias.

 

Na realidade, o Reino Unido é o que a Europa devia ser mas não é.

É uma união política, que tem um governo e uma moeda comuns, mas em que todos votam para eleger o Governo, ao contrário do que sucede na Europa.

Ou seja, a Escócia participa mais no Reino Unido, e manda mais, do que Portugal participa ou manda na Europa.

Apesar de nós sermos mais "independentes" no papel, na realidade os alemães e a Sra Merkel mandam mais em nós do que Cameron manda na Escócia.

É que os escoceses também votam para escolher Cameron, e que eu saiba nunca nenhum português votou na sra.Merkel.

 

É por isso que eu não entendo a Escócia.

Será que eles não percebem que, tornando-se independentes, mas ficando com a libra (moeda comum), se transformam numa espécie de Portugal, Irlanda, Grécia, Chipre?

Ficarão com uma moeda única, mas deixarão de votar para o Governo do Reino Unido, e aí é que deixam mesmo de mandar no seu destino.

Como Portugal, hoje.

 

Se a Escócia disser sim à independência, vai ficar mais fraca e mais dependente, mais parecida connosco.

É estranho que a Escócia queira ser como Portugal, quando na Europa todos deviam ser como a Escócia, um reino independente dentro de um reino unido, com um só Governo e um só Chefe de Estado.  

Mas, o mundo está difícil de compreender, é essa a verdade. 

publicado por Domingos Amaral às 10:58 | link do post | comentar | ver comentários (8)
Segunda-feira, 15.09.14

Novo Banco: vender à pressa, vai dar barraca

A saga do BES continua, agora com novos episódios e um nome diferente, mas com trapalhadas semelhantes.

Vítor Bento era um nome forte, com credibilidade, mas durou muito pouco.

Aparentemente, é um problema de pressa.

Sente-se nas declarações de Carlos Costa, governador do Banco de Portugal, que há que despachar o trambolho o mais rapidamente possível.

O governo faz coro, e repete a ideia. Portas, Pires de Lima, Maria Luís, Passos, todos querem vender, e já.

Para ontem, se fosse possível.

 

Ora, qualquer pessoa com dois dedos de testa sabe que vender à pressa é mau.

É mau se for um carro, uma casa, uma Playstation, e naturalmente é mau também se for um banco.

A pressa do vendedor obriga a baixar o preço, e o negócio é sempre pior.

Ainda por cima num banco que saiu de um colapso, e que se pretende recuperar.

Se a ideia era maximizar o valor da venda, para poupar dinheiro ao contribuinte, a pressa é um disparate.

 

Pelos vistos, Vítor Bento queria mais calma, o que só abona em seu favor.

Pelos vistos, Banco de Portugal e Governo querem vender depressa. O todo ou as partes, não interessa, o que interessa é fazê-lo antes das eleições.

Porém, gerir a situação de bancos com timings políticos já se viu que dá num desastre.

É agora evidente para todos que, desde finais de 2013, era conhecida a situação grave do BES.

Passos, Carlos Costa e a "troika" fizeram uma "gestão política" do assunto, adiando-o para depois da saída da "troika".

Deu no que deu, o BES entrou em colapso total, e esfrangalhou-se.

 

Agora, que as coisas pareciam estabilizar, lá vem a "gestão política" outra vez.

Tudo vendido, antes das eleições, para que não se possa atirar à cara do Governo que não protegeu o contribuinte.

Pois. Até Maio, era "proteger o BES", e ele faliu. Agora, é "proteger o contribuinte", e ou muito me engano ou vai dar barraca da grossa outra vez.

Infelizmente, as estratégias de Carlos Costa e de Passos falharam todas no caso do BES.

Esta será a última oportunidade, mas com tanta incompetência até aqui, é provável que corra muito mal também. 

publicado por Domingos Amaral às 11:23 | link do post | comentar | ver comentários (1)
Terça-feira, 09.09.14

Exportar-nos para fora da recessão não está a resultar

Ainda se lembram da forma gloriosa como o Governo apresentava os números positivos da balança comercial portuguesa?

Aqui há ano e meio, estávamos a exportar mais que a importar, coisa nunca antes vista em 50 anos!

Só o Salazar tinha conseguido tal coisa, dizia a propaganda governamental, de Gaspar, Passos e Portas.

Infelizmente, algum tempo depois, os indicadores voltaram a piorar, as exportações foram perdendo gáz, as importações cresceram, e lá voltou o deficit comercial.

Ou seja, o maravilhoso ajustamento que Gaspar dizia ter conseguido, acabando com o deficit comercial, não durou nada.

E o segundo ajustamento, que Gaspar e Passos também diziam ter conseguido, o do deficit orçamental, lá vai morrendo também.

É natural: não se mudam 300 anos de história económica de um dia para outro.

Apesar dos tontos acharem que sim, a realidade do mundo não muda só porque eles acham que sim.

 

Quase quatro anos depois, está à vista que a linha austeritária do Governo, que quis corrigir dois deficits ao mesmo tempo, para reequilibrar o país, não conseguiu atingir esses objetivos, e só deixou um rasto de recessão, desemprego, e ainda mais dívida pública.

Os pequenos indicadores positivos que melhoraram são isso mesmo, pequenos.

É duro, eu sei, mas a verdade é que temos hoje mais desemprego, crescimento menor, impostos mais altos e salários mais baixos do que há quatro anos, e com uma dívida pública muito maior.

A austeridade expansionista, que Passos e Gaspar defendiam que ia salvar o país depois de uma dieta intensa, nunca passou de austeridade, pois de expansionista não teve nada.

 

Como Mário Draghi veio dizer, era falsa e errada a convicção de que as taxas de juro da dívida pública estavam a subir porque os governos gastavam demais.

Entre 2009 e 2012, as taxas de juro da dívida subiram porque os investidores estavam em pânico com a perspectiva do euro acabar.

Não foi a austeridade brutal que recuperou a confiança, foi a intervenção do BCE, e as palavras de Draghi desde o verão de 2012.

A austeridade não trouxe qualquer melhoria, pelo contrário, só piorou as coisas, deixando um colossal rasto de desperdício e recessão.

Agora, como Draghi também disse, é tempo de estimular as economias, baixar impostos, e outras coisas assim.

Ou seja, é tempo de mudar de políticas, e abandonar em definitivo a austeridade desmiolada.

 

Contudo, não será fácil que isso aconteça com Passos e Maria Luís.

Enquanto na fustigada Grécia já se anunciam fortes baixas dos impostos, por cá continua a conversa da treta, de que não há "folga orçamental", etc, etc.

Parece-me que este Governo não tem qualquer capacidade já para efectuar uma mudança de políticas de 180 graus.

Está amarrado às suas ideias, e com elas irá para o fundo, sem salvação possível.

Para que as políticas mudem, não parece haver outra hipótese a não ser mudar de Governo.

 

 

publicado por Domingos Amaral às 10:50 | link do post | comentar | ver comentários (2)
Quarta-feira, 03.09.14

Draghi contra Merkel, ou o bom contra a vilã

Mario Draghi é um dos poucos líderes europeus que merece o meu apreço.

Há dois anos, em Julho de 2012 e em plena crise financeira europeia, salvou o euro com uma frase e uma promessa.

Enquanto os outros queriam era recuperar a confiança com austeridade draconiana, ele percebeu que a Europa precisava era de um banco central que estivesse totalmente comprometido com a moeda única.

Na altura, os fanáticos da austeridade não quiserem reconhecer o óbvio: depois de Draghi falar, as taxas de juro da dívida pública dos países caíram a pique.

Aquilo que anos de austeridade não tinham conseguido, Draghi conseguiu com umas meras palavras.

 

Foi isso que Draghi veio reconhecer na semana passada, no seu já célebre discurso de Jackson Hole.

Para ele, não foi o excesso de dívida pública de certos países que colocou em causa o euro, mas sim uma falha no papel do BCE como credor de última instância.

Se o BCE tivesse agido a tempo, como fizeram o FED americano ou o Banco de Inglaterra, o pânico europeu não teria crescido.

Mas Draghi disse mais: defendeu que as políticas monetárias e orçamentais devem ser expansionistas, para acabar com a grave crise que assola a Europa.

 

Ora, dizer isto é chocar de frente contra a linha dura da Europa, a linha germânica, defendida por Merkel, Schauble ou Oli Rehn.

Os fanáticos da austeridade, com a Alemanha à cabeça, espumaram de raiva ao ouvir as palavras de Draghi.

Merkel telefonou-lhe logo, a pedir satisfações; e Schauble disse que ele tinha sido mal interpretado.

Para os alemães, não há qualquer dúvida, só a austeridade continua a poder salvar a Europa.

 

Deviam olhar em volta e ver os estragos que as suas políticas provocaram.

A Europa continua afocinhada na crise, com Itália, França e Alemanha em recessão, e outros países em crescimento mínimo.

O desemprego é muito alto, e a deflação já grassa. 

São esses os resultados da austeridade germânica, mas Merkel e Schauble, teimosos e fanáticos, não querem dar o braço a torcer.

Para eles, na Europa germânica só há uma verdade, a da Alemanha e mais nenhuma.

 

Esta é a grande luta europeia do momento, os austeritários contra o BCE.

Merkel, Rehn, Schauble, Passos e Maria Luís, contra Draghi.

Que Deus dê muita força ao super Mário Draghi, é o que eu desejo, para ver se damos cabo dessa gente tão pouco inteligente.

 

 

publicado por Domingos Amaral às 10:35 | link do post | comentar
Segunda-feira, 01.09.14

Ucrânia: que tal partir ao meio, metade para Merkel, metade para Putin?

Já aqui o tinha escrito e volto a escrever: a única solução para a Ucrânia parece ser a divisão do país em dois.

A parte russa, que Putin invadiu com soldados seus mascarados de clandestinos, poderá ser a Ucrânia de Leste, ou Nova Rússia, como Putin prefere.

Terá capital em Donetsk, e ligação ao mar, fazendo fronteira com a Crimeia recentemente anexada.

Quanto à parte ocidental, que deseja juntar-se à Europa, poderá ter capital em Kiev, e chamar-se Ucrânia do Oeste, ou simplesmente Ucrânia.

 

Na verdade, essa separação será apenas a confirmação histórica de uma divisão que durou séculos, entre uma zona de leste, associada à Rússia, e uma zona de Oeste, associada à Polónia.

A Ucrânia, tal como a conhecemos depois da queda da URSS, é uma entidade com pouco significado histórico, e até cultural, pois divide-se entre um leste onde a maioria do povo é russo, e um oeste onde a maioria é ucraniana.

 

Naturalmente, Putin sabe isso, conhece a história da região melhor que os europeus ou americanos, e sabe também que não pode deixar a parte leste do país deslocar-se para uma associação com a Europa germânica.

Portanto, melhor seria que todos, europeus e americanos, aceitassem o destino da história, cedendo a Putin mais um bocado de território para evitar uma destruição ainda maior na região, e a morte de muitos inocentes.

E quem quiser fazer comparações com Hitler devia pensar um pouco melhor, pois nada é igual a 1938 ou 39, o mundo mudou muito.

 

O que as pessoas se têm de perguntar é isto: quem está disposto a morrer por Donetsk?

Não me parece que, nem na América, nem na Europa, existam muitos a querer ir para a guerra.

Sanções, sim, e devem aumentar, mas guerra? Isso ninguém deseja.

publicado por Domingos Amaral às 17:26 | link do post | comentar | ver comentários (4)
Quinta-feira, 07.08.14

O ebola da bolsa

Não há nada que os mercados financeiros temam tanto como a desconfiança.

A desconfiança enche as pessoas de receios, temores de perda do seu dinheiro.

Daí ao medo é um pulo, e ao pânico um saltinho.

A desconfiança é o ebola das bolsas, um vírus que parece incontrolável e para o qual ainda não há remédio.

É esse ebola que parece pairar sobre a bolsa portuguesa.

Ontem caiu tudo, aos trambolhões, e até os juros da dívida subiram.

A bolsa ficou vermelha. E nos bancos e no Governo, o sinal voltou ao laranja.

 

Talvez seja um exagero o que se está a passar.

Roosevelt disse um dia que a única coisa de que devíamos ter medo era do próprio medo.

Estava a falar de guerra, mas podia estar a falar dos mercados financeiros.

Ou de Portugal, nos dias que correm.

Há medo, e esse medo, a sua existência, dá-nos mais medo, e andamos ali às voltas, presos numa espiral de aflição.

 

Mas convém respirar fundo, contar até dez, acreditar que há nisto uma dose de exagero.

As bolsas, muitas vezes, comportam-se como rebanhos de carneirada.

Para onde vai um, vão todos, e ninguém sabe bem porquê, nem quem é o líder.

E quando assim é, é difícil encontrar uma explicação racional para o que está a acontecer.

 

A solução "banco bom" e "banco mau" tem virtualidades.

Protege os depositantes, os clientes normais, os activos bons do BES.

Porém, tem dois pontos fracos.

Primeiro, penaliza muito os accionistas, e isso gera desconfiança na bolsa portuguesa.

Se os accionistas podem perder tudo, para quê ser accionista, sobretudo de bancos com problemas?

Este medo gera uma pressão de venda, pois quando o risco de perda sobe, todos querem evitá-lo.

É verdade, mas também é verdade que, na sexta-feira passada, as acções do BES já só valiam 12 cêntimos, quase nada.

A maior perda já tinha acontecido.

 

O segundo ponto fraco da decisão é a ideia de que serão os outros bancos a ter de resolver o problema do Novo Banco.

Se não for bem privatizado, a um bom preço, são os outros bancos que se chegam à frente e pagam a factura.

Parece injusto, e até um bocado absurdo.

Então são os bancos que nada tiveram a ver com o caso a ter de suportar o imbróglio?

Como, se também eles estão a sair da situação difícil em que estiveram nos últimos anos?

Foi isso que ontem penalizou, e muito, o BCP, o BPI e o Banif.

 

Também aqui, há que colocar um pouco de gelo na ferida.

Em primeiro lugar, esses não são os únicos bancos a actuar em Portugal.

Existem a Caixa, o Santander, o BBVA, o Deustche, o BIG, e muitas outras instituições financeiras.

O fundo de Resolução inclui todos os bancos, não apenas o BCP, o BPI e o Banif.

E pode até dar-se o caso de os futuros compradores nem serem bancos que hoje actuam em Portugal.

 

Além disso, é apressado concluir que isto se vai passar depressa.

O mais provável é a reprivatização do Novo Banco demorar algum tempo.

Poderá ser feita em parcelas, mas ninguém acredita que seja rápida.

Dois anos, menos que isso?

Talvez sim, talvez não.

Seja como for, é cedo para penalizar os outros por algo que não se sabe quando, ou como, vai acontecer. 

 

publicado por Domingos Amaral às 10:25 | link do post | comentar | ver comentários (1)
Segunda-feira, 04.08.14

BES: finalmente alguém tomou juízo...

Nada é mais importante no sistema bancário do que a confiança das pessoas.

Quando ela se perde ou está em risco, tudo se desestabiliza e o pior pode acontecer.

Era isso a que Portugal estava assistir nos últimos dois meses.

A crise no Grupo Espírito Santo estava a contaminar o sistema financeiro e bancário português, e cada dia que passava as coisas ficavam piores.

A bolsa caía, os outros bancos começavam a ser arrastados para a lama, e o receio estava instalar-se.

Qualquer pessoa que conheça as histórias de crises financeiras, por todo o mundo, sentia que Portugal estava já num sarilho.

Havia que actuar, e depressa, para evitar a derrocada de um país que ainda está frágil.

 

Infelizmente, Governo e Banco de Portugal andaram sempre a correr atrás do prejuízo.

Só na semana passada aceitaram aquilo que era evidente, que o BES estava perdido, e que o sistema estava minado.

Finalmente, o supervisor acordou, e o Estado chegou-se à frente para parar o sarilho do BES.

Depois de meses e meses de erros e trapalhadas, declarações tontas e descobertas terríveis, fez-se o que estava escrito nas estrelas há muito: uma intervenção pública no BES.

Só pecou por tardia, pois pelo caminho muito valor se destruiu, e muita instabilidade desnecessária se gerou.

 

A solução "banco bom/banco mau" é inteligente, e pode salvar muita coisa.

Proteje bem os depositantes, as empresas-clientes, os trabalhadores do BES.

Tambem protege os obrigacionistas, e quem tem fundos geridos pelo banco, desde que sem ligações aos outros negócios contaminados.

Isso é bom, pois nenhum desses grupos de pessoas foi responsável pela desgraça que derreteu o banco.

 

Quanto aos accionistas, a solução penaliza-os muito, embora talvez em excesso no caso de serem pequenos.

Percebe-se que se quis castigar e punir os grandes, sejam do Grupo Espírito Santo, franceses, brasileiros ou portugueses.

Todos perdem fortunas colossais. 

Mas, e os pequenos accionistas, que não tiveram responsabilidades na gestão?

Também perdem, e sem culpa, mas esse é o risco de quem compra acções, e elas já valiam muito pouco na sexta-feira.

Quem não vendeu, perde tudo, e pode recuperar muito pouco no futuro. 

 

Para já, evitou-se uma crise gravíssima, e evitou-se o descalabro na economia.

Foi o Estado que o fez, pois mais ninguém o podia fazer.

É para isso que existe o Estado, e é por isso que é importante a sua presença.

A economia privada, só por si, não chega.

Quando a crise é sistémica, o Estado tem de intervir, por muito que isso custe aos liberais e aos críticos. 

 

Mas, não devemos esquecer o que se passou, nem os erros que foram cometidos pelo Banco de Portugal nesta crise.

Só apontar o dedo aos "fraudulentos" não é suficiente.

É evidente que devem ser feitas investigações, acusações, e julgamentos em tribunal.

É assim com todos os crimes, e se existiram crimes têm de ser julgados os seus responsáveis.

 

Só que isso não absolve o supervisor das suas falhas.

É absurdo que se tenha andado a aplicar uma estratégia desde Setembro de 2013, tentando "isolar" o BES dos problemas do Ges, para agora descobrir que isso foi impossível.

Quanta inocência...

É absurdo que se tenha aprovado um aumento de capital em Junho, ainda liderado pela anterior administração, sabendo já que essa mesma administração iria ser destituída.

Que desplante...

É absurdo que se tenha destituído uma administração e se tenha demorado semanas a nomear uma nova.

Que loucura...

O vazio de poder que o Estado criou no BES que abriu a caixa de Pandora, e tudo se descontrolou.

 

Em conclusão, foram meses de erros do supervisor, que ajudaram ao caos sem o parar.

Que se consiga agora salvar a situação, é bom e deve ser aplaudido.

Porém, a gestão desta crise foi um desastre até à salvação final, e Carlos Costa, governador do Banco de Portugal, sai deste imbróglio com muito menos força do que no passado.  

O regulador não pode ser um avozinho simpático que repreende os netos, e que depois se surpreende que eles sejam muito mal comportados.

publicado por Domingos Amaral às 12:07 | link do post | comentar | ver comentários (2)
 

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