O que se passa com o cabelo das mulheres?

A maior diferença entre os homens e as mulheres não é o sexo, mas o cabelo. No sexo, até somos parecidos. Suamos, gememos, usamos a boca e as mãos, gostamos de antecipar com gozo e descansar no fim. Mas nos cabelos, somos totalmente diferentes. Os homens pensam muito pouco no cabelo, mas as mulheres só pensam no cabelo. 

Não quero com isto dizer que as mulheres não pensam em mais nada, bem pelo contrário. A grande diferença é que as mulheres, além de pensarem por dia em milhares de coisas, pensam todos os dias e quase todas as horas também no cabelo, enquanto os homens pensam em muitas coisas por dia, mas só pensam no cabelo para aí duas ou três vezes por mês, pois quando se penteiam de manhã quase nem reparam no que estão a fazer. 

O cabelo das mulheres é uma preocupação permanente (a expressão é adequada, embora não queira dizer que elas estejam com uma "permanente"), é uma angústia diária mas também uma fantasia contínua. Logo de manhã, pensam nele, admiram-no, lavam-no, secam-no, penteiam-no, voltam a penteá-lo, criticam-no por estar em má forma, por ser teimoso ou caprichoso, por ter manias, por estar fofo demais ou meramente baço.

A meio da manhã, voltam a olhar para ele, a fazer-lhe festas, a planear mudá-lo ou a repensá-lo, coisa que virão a repetir antes do almoço, a meio da tarde, à chegada a casa, antes do jantar, depois do jantar, antes de deitar e quando se levantam pela última vez antes de adormecerem, só para ir espreitar como é que poderia ficar o cabelo se lhe fosse aplicada uma certa ideia com que andam na cabeça.

Já pensei em organizar um dicionário específico para compreender as 300 coisas diferentes que uma mulher pode fazer ao seu cabelo. Desisti quando percebi que eram bem mais de 300, e que por mais que me esforçasse iria ter imensa dificuldade em distinguir as diferenças entre "nuances", "madeixas", "brushing", "extensões", "permanentes", "colorações", "descolorações", "desfrisar", e mil e outras expressões que agora não recordo, mas que pertencem a uma linguagem típica feminina, o "cabelês", uma explosiva mistura entre francês, inglês, latim e crioulo, com leves influências de maori e paquistanês, que só é falada por mulheres e que o cérebro masculino não consegue compreender, quanto mais falar correctamente. 

Isto não quer dizer que não goste dos cabelos das mulheres. Eu gosto muito. Sejam eles lisos ou encaracolados, curtos ou compridos, com rabo de cavalo ou ganchos, apanhados ou soltos, loiros, morenos ou ruivos, todos me agradam, dependendo do dia e da hora. Quer dizer, não gosto de tudo. Por exemplo, não gosto de cabelos "armados", tipo jubas de leão, esse género volumoso que às vezes se vê em certos anúncios e algumas festas. Nem percebo muito bem como é que eles ficaram assim, parecem uma instalação de arte falhada. 

Mas o que eu gosto mesmo é da alegria feminina que nasce quando as mulheres se sentem bem com o seu cabelo, o que é normalmente na meia hora seguinte a terem vindo do cabeleireiro, ou de o terem penteado em casa. As mulheres ficam radiosas, os olhos brilham de felicidade quando se sentem bem com os seus cabelos. É como se um raio de luz as tivesse atingido, um pequenino milagre tivesse acontecido na vida delas. É o momento certo para os homens as elogiaram, não só porque é verdade, mas sobretudo porque elas gostam muito de ser elogiadas quando os cabelos delas estão no momento "Premium" do dia. É preciso estar à coca, e saber aproveitar esse instante maravilhoso para as mimar e amar, pois é o momento mais feliz da existência feminina diária, e não se deve deixar passar sem o celebrar devidamente.

Até porque costuma ser um momento breve, como o momento em que o sol toca na água antes de se pôr. Dez ou quinze minutos mais tarde, já há um leve atrito entre uma mulher e o seu cabelo, uma ponta solta, um caracol maroto que se desfez, um irritante tufinho que teve a suprema lata de se mexer imprevisivelmente e lançar uma pequenina sombra sobre a alma daquela rapariga.

Portanto, se falhar o momento certo do elogio, não arrisque muito. É perigosíssimo passar por forçado. As mulheres têm um radar que percebe de imediato quando os homens estão a dizer coisas só por dizer, e não gostam disso. Por mais estranho que pareça, as mulheres preferem uma crítica mais franca a um indiferente "está óptimo", dito sem convicção. 

Mas atenção, que a fronteira entre franqueza e brutalidade é, no que que toca ao cabelo feminino, mais fina que o próprio cabelo. Ser desagradável com uma mulher, dizendo que não se gosta do cabelo dela, é semear uma ventania na relação que pode originar numa tempestade. É que não gostar do cabelo de uma mulher é o mesmo que não gostar dela, o que gera um enorme melodrama doméstico que colocará em risco essa noite, mas sobretudo a crença dela de que seja mesmo amada pelo homem. São muitos os homens que, por esse mundo fora, tiveram de explicar às mulheres que gostavam mesmo delas, depois de terem dado um passo em falso, criticando o seu cabelo.

Aliás, o célebre "vê-se mesmo que já não gostas de mim" nasceu numa certa noite, quando um homem das cavernas olhou para o "brushing" espantoso da sua mulher das cavernas e perguntou, apontando com a moca para o seu cabelo: "o que é esse ninho de ratos na tua cabeça"? O resto é história universal...

publicado por Domingos Amaral às 11:48 | link do post